Lula-vampiro surpreende ciência ao exibir o maior genoma entre moluscos vivos

Genoma gigante da lula-vampiro revela segredos antigos dos cefalópodes (Imagem: Emőke Dénes/ Wikimedia Commons)
Genoma gigante da lula-vampiro revela segredos antigos dos cefalópodes (Imagem: Emőke Dénes/ Wikimedia Commons)

Entre as formas de vida mais misteriosas das profundezas oceânicas, a lula-vampiro do inferno (Vampyroteuthis infernalis) sempre ocupou um lugar especial. Agora, um novo sequenciamento genético trouxe uma revelação monumental: o animal possui o maior genoma conhecido entre os moluscos, alcançando até 14 gigabases, um valor que supera com folga o de lulas, polvos e chocos modernos. Publicado na revista iScience, o estudo conduzido por equipes da Áustria e do Japão coloca essa espécie pré-histórica no centro das discussões sobre evolução marinha.

Mais do que um dado numérico, o tamanho extraordinário do genoma redefine a posição da lula-vampiro dentro da árvore evolutiva. Como sobrevivente de uma linhagem com mais de 180 milhões de anos, o animal funciona como um arquivo vivo de características genéticas que antecedem os cefalópodes atuais. Após esse contexto, vale destacar cinco aspectos essenciais revelados pela pesquisa:

  • Genoma entre 11 e 14 gigabases, superando todos os cefalópodes já sequenciados;
  • Arquitetura cromossômica conservada, preservada desde o período Jurássico;
  • Traços híbridos, combinando características de espécies de oito e dez braços;
  • Valor evolutivo singular, por ser o único membro vivo da ordem Vampyromorphida;
  • Papel como referência ancestral, permitindo reconstruir a origem das lulas e dos polvos modernos.

Uma cápsula temporal preservada no fundo do mar

Embora não seja uma lula verdadeira, a espécie desempenha um papel central na compreensão do surgimento dos cefalópodes atuais. Seu genoma permanece próximo ao de formas ancestrais, enquanto lulas e polvos passaram por alterações estruturais profundas ao longo de milhões de anos. Essa conservação faz da lula-vampiro um ponto de comparação raro e extremamente valioso.

Espécie abissal preserva código genético que redefine a evolução marinha (Imagem: National Marine Sanctuaries)
Espécie abissal preserva código genético que redefine a evolução marinha (Imagem: National Marine Sanctuaries)

A oportunidade de sequenciamento surgiu após a captura acidental de um exemplar em águas profundas da Baía de Suruga, no Japão, habitat natural onde o animal vive a mais de 600 metros de profundidade. A partir do material genético obtido, os cientistas compararam seus cromossomos a diferentes grupos marinhos, detectando padrões que revelam conexões até então invisíveis entre linhagens distintas.

A importância dessa descoberta para a evolução marinha

A lula-vampiro funciona como uma “linha de base” genética para estudar como lulas, polvos e chocos se diversificaram. Ao preservar elementos primitivos, ela permite observar etapas da evolução que estavam perdidas em outras espécies mais derivadas. 

Novas investigações devem aprofundar esse mapa genético, abrindo caminho para esclarecer como estruturas sofisticadas, comportamentos complexos e adaptações únicas surgiram nesses animais.

Leandro Sinis é biólogo, formado pela UFRJ, e atua como divulgador científico. Apaixonado por ciência e educação, busca tornar o conhecimento acessível de forma clara e responsável.