Proteína da gordura pode explicar obesidade e perda de peso extrema

Obesidade e lipodistrofia compartilham riscos metabólicos. (Foto: Africa Images e Getty Images via Canva)
Obesidade e lipodistrofia compartilham riscos metabólicos. (Foto: Africa Images e Getty Images via Canva)

A compreensão científica sobre como o corpo armazena, libera e usa gordura está avançando rapidamente, e novas descobertas começam a revelar que processos antes considerados simples são, na verdade, altamente sofisticados. É o caso de um estudo recente publicado na revista Cell Metabolism, conduzido por pesquisadores da Universidade de Toulouse, que investigaram a proteína HSL e mostraram que seu papel vai muito além do que se imaginava. 

Embora conhecida pela atuação na mobilização de lipídios, a proteína também exerce uma função estratégica dentro do núcleo dos adipócitos, o que ajuda a explicar por que condições tão opostas quanto a obesidade e a lipodistrofia podem causar desequilíbrios semelhantes.

A função oculta da HSL dentro do núcleo

Até pouco tempo, acreditava-se que a HSL atuava principalmente na quebra de gordura para gerar energia em momentos de maior demanda. 

No entanto, o estudo “Hormone-Sensitive Lipase Regulates Adipocyte Nuclear Function”, assinado por Dominique Langin e pesquisadores da equipe, identificou que a HSL também participa da manutenção da integridade do tecido adiposo a partir do interior do núcleo celular. Essa descoberta redefine a visão clássica sobre a proteína e abre espaço para novas interpretações sobre o metabolismo da gordura.

De acordo com os experimentos, a localização da HSL na célula determina comportamentos metabólicos relevantes. Quando ela permanece ativa dentro do núcleo, contribui para a expansão adequada do tecido adiposo, processo fundamental para evitar tanto o acúmulo excessivo quanto a perda descontrolada de gordura.

Quando a falta da HSL provoca o efeito oposto

Adipócitos controlam o armazenamento de gordura corporal. (Foto: Getty Images via Canva)
Adipócitos controlam o armazenamento de gordura corporal. (Foto: Getty Images via Canva)

Para entender seu papel com mais profundidade, os cientistas removeram a proteína do organismo de camundongos. O resultado foi surpreendente: os animais não se tornaram obesos; ao contrário, desenvolveram lipodistrofia, condição marcada pela perda grave de gordura corporal. Essa alteração levou a riscos metabólicos semelhantes aos observados na obesidade, como resistência à insulina, inflamação e acúmulo de gordura em órgãos internos.

Esses achados reforçam que não é apenas a quantidade de gordura no corpo que importa, mas a qualidade e funcionalidade dos adipócitos. Quando as células de gordura não conseguem desempenhar suas funções regulatórias, tanto a deficiência quanto o excesso podem gerar consequências graves.

Movimento da HSL: o ponto central da regulação

Outro ponto relevante revelado pelo estudo é que a adrenalina influencia diretamente o comportamento da proteína. Em períodos de jejum, ela estimula a saída da HSL do núcleo, permitindo que os mecanismos de queima de gordura sejam ativados. Já em camundongos obesos, a proteína permanece acumulada no núcleo, como se estivesse “presa”, impedindo o funcionamento adequado dessa via metabólica.

Essa dinâmica mostra que a mobilidade da HSL dentro da célula é essencial para a regulação saudável do tecido adiposo.

Implicações para o tratamento de doenças metabólicas

A descoberta destaca que tanto a obesidade quanto a lipodistrofia se originam de adipócitos disfuncionais, indicando que terapias futuras podem mirar na organização nuclear da HSL e no equilíbrio metabólico interno das células. Isso sugere novos caminhos para compreender doenças relacionadas ao metabolismo, indo além da simples relação entre ingestão calórica e acúmulo de gordura.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.