A capacidade da civilização maia de antecipar eclipses solares sempre intrigou pesquisadores. Agora, uma nova análise publicada na Science Advances lança luz sobre como esse povo foi capaz de produzir previsões altamente precisas usando apenas observações celestes e registros meticulosos. O estudo examina com profundidade o Códice de Dresden, um dos raros manuscritos maias preservados, oferecendo novas interpretações sobre seu funcionamento.
Antes de avançarmos, vale destacar por que esse documento é tão valioso para a ciência atual:
- É um dos poucos manuscritos maias inteiros sobreviventes;
- Reúne informações astronômicas com grande organização;
- Traz registros de ciclos lunares associados a eclipses;
- Foi utilizado por vários séculos na Mesoamérica;
- Permite comparar previsões antigas com cálculos atuais.
Um sistema baseado em ciclos e reajustes matemáticos
A pesquisa conduzida por John Justeson e Justin Lowry analisou as 78 páginas do códice, escritas entre os séculos XI e XII em papel de casca de árvore. Esses registros incluem dados sobre astronomia, estações do ano, medicina e rituais religiosos. Entretanto, o ponto que mais chama a atenção é a presença de uma longa tabela de 405 meses lunares, fundamental para as previsões de eclipses.

Até recentemente, especialistas sabiam que essa tabela tinha relação com o fenômeno, mas não compreendiam como ela era aplicada na prática. O novo estudo propõe que os maias adotavam um sistema de reinicialização seletiva do calendário lunar, reiniciando o ciclo não no mês 405, mas no mês 358. Esse ajuste permitiria manter alinhamentos entre o Sol, a Lua e a Terra pelo máximo de tempo possível.
Além disso, o ciclo parece incluir pequenos reajustes adicionais ao longo dos séculos, garantindo que eventuais desvios acumulados fossem compensados. O mecanismo é tão refinado que impressiona mesmo quando comparado às ferramentas modernas de cálculo astronômico.
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Precisão além do esperado para uma civilização pré-moderna
Ao comparar os registros do códice com dados astronômicos contemporâneos, os pesquisadores descobriram que o método maia produzia desvios de apenas algumas horas em relação ao horário real dos eclipses que ocorreram entre 350 e 1150 d.C. Essa margem reduzida demonstra o alto nível de observação empírica e matemática alcançado pela civilização.

O conhecimento astronômico não tinha apenas função científica: ele também orientava rituais e cerimônias religiosas, especialmente durante períodos de eclipse solar total. Para os maias, os astros influenciavam a fertilidade da terra, as colheitas e o equilíbrio espiritual da comunidade. Portanto, prever eclipses não era apenas uma proeza técnica, mas também uma necessidade cultural.
Um legado científico preservado em poucas páginas
Com grande parte dos manuscritos maias destruída após a chegada dos colonizadores europeus, o Códice de Dresden se tornou um tesouro insubstituível. Graças à combinação de registros lunares extensos e ajustes sistemáticos, o documento revela uma estratégia sofisticada que evidencia a inteligência matemática e o profundo vínculo dos maias com o céu.
O novo estudo reforça que, mesmo sem instrumentos ópticos, essa civilização foi capaz de compreender padrões astronômicos complexos, deixando um legado que ainda hoje inspira pesquisadores de diversas áreas.

