O lugar onde vivemos vai muito além de um simples endereço. De acordo com uma nova pesquisa publicada na revista Alzheimer’s & Dementia: Behavior & Socioeconomics of Aging, fatores como poluição, moradia, renda e acesso a oportunidades podem literalmente moldar a estrutura e o funcionamento do cérebro.
Cientistas da Universidade Wake Forest analisaram exames cerebrais e marcadores biológicos de 679 adultos e encontraram uma ligação clara entre as condições do bairro e o risco de desenvolver demência. Em regiões com maior desigualdade social e ambiental, os cérebros apresentaram camadas corticais mais finas, fluxo sanguíneo alterado e mudanças na substância branca, todas associadas a um maior risco de declínio cognitivo.
Desigualdade social deixa marcas no cérebro

Os resultados mostraram que a desigualdade social não é apenas um problema econômico: ela deixa marcas biológicas mensuráveis. Participantes que viviam em áreas com alta vulnerabilidade social e ambiental apresentaram sinais precoces de alterações vasculares cerebrais e redução da espessura cortical.
Entre os grupos mais afetados estavam participantes negros residentes em bairros com maiores índices de obesidade e desvantagem social, o que reforça o impacto da injustiça ambiental e estrutural na saúde cerebral.
Esses dados reforçam que a demência não é apenas resultado de genética ou estilo de vida, mas também de condições externas, como:
- Exposição a poluição atmosférica;
- Falta de alimentação saudável;
- Acesso limitado a espaços verdes e cuidados médicos;
- Estresse crônico associado à desigualdade.
A biologia da desigualdade
Para compreender melhor essas relações, os pesquisadores usaram três índices nacionais:
- Índice de Privação de Área;
- Índice de Vulnerabilidade Social;
- Índice de Justiça Ambiental.
Pontuações mais altas nesses indicadores se correlacionaram com mudanças cerebrais associadas à demência, incluindo redução do fluxo sanguíneo e alterações na substância branca, essenciais para a comunicação entre as regiões do cérebro.
Esses resultados colocam a neurociência e a saúde pública lado a lado, revelando que a desigualdade social está literalmente gravada no cérebro humano.
Cuidar do bairro é cuidar da mente
O estudo reforça que melhorar a saúde do cérebro exige mais do que hábitos individuais. Políticas públicas voltadas à habitação digna, ar limpo, transporte seguro e alimentação saudável podem ser determinantes para reduzir o risco de demência em comunidades inteiras.
A ciência mostra, assim, que cuidar do ambiente em que vivemos é também cuidar do cérebro. O caminho para uma mente saudável começa, muitas vezes, fora da cabeça, e dentro da sociedade.