A astronomia moderna tem revelado estruturas cada vez mais antigas, mas raramente algo rompe tanto nossas expectativas quanto a descoberta da galáxia MPG-CR3, apresentada no The Astrophysical Journal Letters. Formada há cerca de 11 bilhões de anos, ela exibe características que sugerem a presença de estrelas da População III, as primeiras a brilharem após o Big Bang, estrelas que, teoricamente, já não existiriam em nenhum lugar observável do cosmos.
Logo de início, CR3 chamou atenção por sua composição extremamente “limpa”: praticamente sem metais, algo incompatível com o ambiente cósmico daquela época. A surpresa aumenta quando se constata que sua idade aparente é de apenas 2 milhões de anos, o que indica um ciclo de formação estelar muito recente. Destaques do achado:
- Composição com apenas 0,7% da metalicidade solar;
- Sinais fortes de hidrogênio e hélio, sem elementos pesados;
- Estrutura jovem em plena era de galáxias maduras;
- Possível abrigo para estrelas da População III;
- Localização em uma região subdensa, isolada de contaminação cósmica.
Uma assinatura que destoa do universo ao redor
Ao analisar dados do JWST, do Very Large Telescope e do Subaru, os pesquisadores identificaram linhas espectrais incomuns. A nitidez das emissões de hidrogênio e hélio e a ausência quase completa de oxigênio indicam um cenário nunca visto em galáxias daquela época. Em outras palavras, CR3 parece ter nascido em um bolsão cósmico isolado do material enriquecido produzido por gerações anteriores de estrelas.

Esse isolamento, conhecido como região subdensa, poderia ter mantido a nuvem original de gás “protegida” do processo de enriquecimento químico que dominou o universo após o Meio-dia Cósmico.
O enigma do hélio II e o que ele pode significar
Curiosamente, a linha de emissão de He II, um dos marcadores esperados para estrelas da População III, não foi observada. Duas possíveis explicações são propostas: interferência de emissões de OH em uma banda próxima ou a dissipação natural do sinal, que se enfraquece rapidamente em poucos milhões de anos.
Mesmo assim, a ausência desse marcador não elimina o cenário. Na verdade, reforça o caráter enigmático da galáxia e abre espaço para novas interpretações teóricas sobre ciclos estelares primordiais.
Por que essa descoberta importa tanto
Se confirmada, CR3 pode ser a primeira galáxia dominada por estrelas primordiais já identificada. Isso significaria que objetos “intocados” podem existir muito mais próximos, e em maior número, do que imaginávamos.
Além disso, permitiria estudar diretamente a química e a evolução das primeiras estrelas, uma incógnita que atravessa décadas de busca. O universo, mais uma vez, demonstra que ainda guarda segredos capazes de remodelar nossa compreensão sobre sua própria história.

