Fósseis de 20 milhões de anos mostram ancestral dos peixes-boi modernos

Peixes-boi pré-históricos se alimentavam de ervas marinhas. (Foto: Reprodução / Alex Boersma)
Peixes-boi pré-históricos se alimentavam de ervas marinhas. (Foto: Reprodução / Alex Boersma)

Uma descoberta paleontológica no Catar trouxe à tona um peixe-boi em miniatura que permaneceu escondida por cerca de 21 milhões de anos. Apesar do tamanho reduzido, esse mamífero marinho extinto teve um papel essencial na formação e manutenção de pradarias marinhas no antigo Golfo Pérsico, desempenhando uma função ecológica semelhante à dos peixes-boi e dugongos modernos.

O achado foi descrito no estudo científico Alta abundância de peixes-boi do Mioceno Inferior no Catar demonstra a evolução repetida de engenheiros de ecossistemas de ervas marinhas no leste do Tétis, publicado em 2025 na revista PeerJ, tendo Nicholas D. Pyenson como autor principal.

O sítio fossilífero que mudou o entendimento da região

Os fósseis foram identificados em Al Maszhabiya, no sudoeste do Catar, um dos sítios mais ricos do mundo em ossos fossilizados de peixes-boi. Inicialmente confundidos com restos de répteis, os materiais revelaram uma concentração excepcional desses herbívoros marinhos do início do Mioceno.

As evidências geológicas indicam que a área já foi um ambiente marinho raso, com alta biodiversidade, incluindo tubarões, peixes ósseos, tartarugas e cetáceos primitivos. Nesse cenário, extensos campos de ervas marinhas sustentavam grandes populações desses mamíferos.

Uma nova espécie entra para a história

Reconstrução 3D revela morfologia da Salwasiren extinta. (Foto: Nicolau D. Pyenson​ via PeerJ)
Reconstrução 3D revela morfologia da Salwasiren extinta. (Foto: Nicolau D. Pyenson​ via PeerJ)

A análise detalhada dos fósseis levou à identificação de uma espécie inédita, denominada Salwasiren qatarensis. O nome faz referência à Baía de Salwa e ao Catar, país onde os fósseis foram encontrados.

Esse peixe-boi pré-histórico pesava aproximadamente 113 quilos, sendo consideravelmente menor que os atuais. Além disso, apresentava características anatômicas mais primitivas, como pequenos ossos nos membros posteriores e presas reduzidas, oferecendo pistas importantes sobre a evolução desses animais.

Engenheiros antigos das pradarias marinhas

Mesmo com porte modesto, a Salwasiren qatarensis teve papel ecológico relevante. Ao se alimentar de ervas marinhas e revolver o sedimento, ajudava a:

  • Redistribuir nutrientes no fundo marinho
  • Manter a vitalidade das pradarias subaquáticas
  • Sustentar a biodiversidade costeira

Essas funções reforçam a ideia de que, ao longo do tempo, diferentes espécies ocuparam o mesmo papel ecológico no Golfo Pérsico.

O que o passado ensina sobre o futuro dos oceanos

O registro fóssil de Al Maszhabiya oferece informações valiosas sobre como os ecossistemas marinhos responderam a mudanças climáticas, variações no nível do mar e alterações de salinidade ao longo de milhões de anos. Esses dados são especialmente relevantes diante das ameaças atuais às pradarias marinhas e aos dugongos modernos.

Ao conectar passado e presente, a descoberta mostra que a relação entre o Golfo Pérsico e os peixes-boi é antiga, contínua e fundamental para compreender a resiliência dos ecossistemas costeiros.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.