Falta de nutrientes muda comportamento de tumores cerebrais, aponta pesquisa

Cérebro reage à escassez e freia avanço tumoral. (Foto: Getty Images via Canva)
Cérebro reage à escassez e freia avanço tumoral. (Foto: Getty Images via Canva)

O crescimento dos tumores cerebrais pode ser influenciado por algo além das próprias células cancerígenas: o ambiente que as cerca. Uma pesquisa publicada na revista PLOS Biology, conduzida por cientistas do Peter MacCallum Cancer Centre, explorou como a falta de nutrientes altera o comportamento de tumores no cérebro e revelou um mecanismo pouco conhecido que interfere diretamente na velocidade de expansão dessas células.

Escassez de nutrientes e o impacto no avanço tumoral

Para investigar essa relação, os pesquisadores utilizaram a drosófila, um tipo de mosca, modelo amplamente empregado na biologia por permitir observação precisa e rápida de alterações metabólicas. 

Nas larvas da mosca, foi induzido um tumor formado por células-tronco neurais. Depois, os animais foram separados em dois grupos: um com alimentação habitual e outro submetido a uma dieta reduzida para simular um ambiente de limitação energética.

Esse modelo possibilitou monitorar como o tumor reage quando sua principal fonte de energia, os aminoácidos, começa a faltar. Essa estratégia reflete uma das características mais marcantes dos tumores cerebrais: eles dependem intensamente do fornecimento contínuo de combustível para crescer.

O papel da barreira hematoencefálica

Transportador de nutrientes controla ritmo do tumor. (Foto: Photo Library via Canva)
Transportador de nutrientes controla ritmo do tumor. (Foto: Photo Library via Canva)

O foco central da investigação foi a barreira hematoencefálica, uma estrutura essencial para proteger o sistema nervoso e gerenciar o que entra e sai do cérebro. Para isso, os cientistas marcaram um transportador específico, chamado Path (Pathetic), responsável por conduzir aminoácidos até o tecido cerebral.

Além disso, foram analisados parâmetros como:
• volume do tumor
• intensidade da multiplicação celular
• atividade de vias metabólicas essenciais, como a mTOR, dependente do fluxo adequado de aminoácidos

Uma resposta inesperada do cérebro ao tumor

Nos cérebros saudáveis, a falta de nutrientes costuma levar a barreira hematoencefálica a aumentar a atividade de Path, em uma tentativa natural de compensar a escassez. Entretanto, quando há um tumor presente, o comportamento é invertido: a barreira reduz a expressão do transportador justamente durante a falta de nutrientes.

Essa queda limita a passagem de aminoácidos para o tumor, enfraquecendo as vias metabólicas que sustentam a divisão celular. Como consequência, o tumor cresce mais lentamente.

Quando os pesquisadores elevaram artificialmente a quantidade de Path, mesmo em condições de pouca nutrição, o tumor voltou a acelerar. Essa observação confirma que o transportador é um ponto estratégico no controle do ritmo tumoral.

Possíveis caminhos para terapias futuras

A descoberta destaca que o comportamento tumoral depende não apenas das células cancerígenas, mas também da forma como o ambiente metabólico responde às variações de nutrientes. Embora ainda não seja possível afirmar que o mesmo processo ocorre em humanos, o estudo abre espaço para novas abordagens que busquem manipular a entrada de nutrientes para desacelerar tumores cerebrais.

Caso transportadores equivalentes ao Path sejam identificados em seres humanos, intervenções capazes de controlar seu funcionamento podem se tornar alternativas promissoras no futuro.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.