A capacidade de voar foi uma das maiores revoluções evolutivas da história animal e, segundo uma nova pesquisa publicada na Current Biology, ela pode ter surgido graças a um circuito genético capaz de ampliar sinais de desenvolvimento. Cientistas analisaram o funcionamento desse mecanismo em moscas-das-frutas e descobriram uma pista surpreendente sobre como os insetos ancestrais expandiram a formação de tecidos até criar estruturas complexas como asas.
Logo no início do estudo, os autores destacam que o crescimento harmonioso de órgãos depende de moléculas sinalizadoras chamadas morfógenos. Esses sinais atuam como mapas químicos que orientam cada célula sobre seu destino. Entretanto, para que tecidos extensos se formem, esses sinais precisam alcançar longas distâncias, algo que sempre despertou dúvidas sobre como o processo se sustenta em estruturas isoladas, como brotos de asas. Principais achados da pesquisa:
- Morfógenos definem a arquitetura de órgãos ao orientar células em desenvolvimento;
- O morfógeno Dpp é crucial para a formação da asa em moscas;
- Um gradiente reverso criado pelo gene Brinker amplifica o alcance de Dpp;
- Brinker existe apenas em insetos, sugerindo papel evolutivo exclusivo;
- O circuito pode ter surgido junto com a evolução das asas há 400 milhões de anos.
Onde a química do desenvolvimento encontra a história evolutiva

Para investigar essa expansão do sinal, a equipe analisou como o Dpp se distribui no tecido da asa. À medida que seu gradiente enfraquece, surge um segundo gradiente, o de Brinker, cuja expressão aumenta exatamente onde o Dpp diminui. Essa relação inversa funciona como um circuito de feedback que reforça informações posicionais mesmo longe da fonte sinalizadora, garantindo que células distantes recebam instruções claras.
Segundo o estudo, esse circuito permite que tecidos originalmente pequenos passem a crescer de forma coordenada, abrindo espaço para estruturas maiores e mais elaboradas. Essa descoberta levantou uma nova questão: quando esse mecanismo surgiu na história evolutiva dos insetos?
Uma fronteira genética entre insetos com asas e sem asas
Ao examinar sequências genômicas, os pesquisadores observaram que o gene Brinker aparece exclusivamente em insetos e não em crustáceos proximamente relacionados. Além disso, ao estudar a traça-de-fogo, um inseto primitivo sem asas, descobriram que, embora o gene esteja presente, ele não forma o gradiente reverso nem participa da amplificação do sinal Dpp.

Isso indica que o circuito só teria sido incorporado funcionalmente após o surgimento dos insetos alados, possivelmente contribuindo para o desenvolvimento das primeiras asas. A evolução do voo coincidiu com profundas mudanças ecológicas no planeta, permitindo que os insetos ocupassem nichos antes inacessíveis.
O estudo aponta que a incorporação funcional de Brinker ao sistema de sinalização Dpp pode ter sido uma invenção evolutiva crucial, permitindo a expansão dos tecidos embrionários necessários para o voo. Essa pequena modificação genética teria desencadeado uma das maiores diversificações biológicas da Terra.

