Cientistas explicam por que certos sons causam tanta irritação em algumas pessoas

Sons como mastigação e cliques podem gerar ansiedade. (Foto: Pixelshot via Canva)
Sons como mastigação e cliques podem gerar ansiedade. (Foto: Pixelshot via Canva)

Sons que passam despercebidos para a maioria das pessoas, como o mastigar de alguém, o clique de uma caneta ou uma respiração mais forte, podem ser insuportáveis para quem sofre de misofonia, um transtorno ainda pouco compreendido, mas que vem despertando crescente interesse científico.

Um estudo publicado no British Journal of Psychology ajudou a esclarecer o que realmente acontece no cérebro de quem vive essa hipersensibilidade sonora. A pesquisa indica que a misofonia não se resume a uma simples irritação, mas está relacionada a mecanismos cognitivos e emocionais mais amplos, que afetam a forma como a pessoa percebe e reage ao ambiente.

Som ativa o cérebro emocional

A misofonia está associada a reações emocionais desproporcionais diante de estímulos sonoros específicos. Raiva, ansiedade, nojo e até vontade de fugir do local são respostas comuns.
Essas reações, segundo os pesquisadores, estão ligadas a dificuldades em mudar o foco da atenção e a uma baixa flexibilidade cognitiva, o que faz com que a mente da pessoa “trave” diante do som incômodo.

Além disso, muitos indivíduos com misofonia apresentam tendência à ruminação, ou seja, ficam repetindo pensamentos negativos sobre o desconforto causado, o que reforça o ciclo emocional e aumenta o sofrimento.

Transtorno que vai além do ouvido

Transtorno envolve emoções e atenção, não só o ouvido. (Foto: Pexels via Canva)
Transtorno envolve emoções e atenção, não só o ouvido. (Foto: Pexels via Canva)

Embora o gatilho principal seja auditivo, a misofonia envolve alterações cerebrais e emocionais complexas. Estudos de neuroimagem destacam o papel do córtex insular anterior, região do cérebro responsável por integrar emoções, atenção e percepção corporal.

Nos testes realizados, pessoas com misofonia apresentaram maior dificuldade para alternar entre tarefas mentais, especialmente quando envolviam estímulos emocionais.
Isso sugere que o problema está mais relacionado à regulação emocional e ao controle da atenção do que à simples percepção sonora.

Impacto social e emocional

Quem convive com a misofonia frequentemente enfrenta situações de constrangimento e isolamento. O medo de reagir mal a determinados sons leva à evitação de ambientes sociais, como almoços em grupo, transportes públicos ou reuniões.

Essas dificuldades podem gerar estresse crônico, baixa autoestima e ansiedade social, mostrando que o transtorno tem consequências reais para a saúde mental e para o convívio cotidiano.

Caminhos para compreensão e acolhimento

Compreender a misofonia como um fenômeno neuropsicológico e não apenas comportamental é essencial para reduzir o estigma.

Pesquisas como a liderada por Mercede Erfanian, da ESSCA School of Management, sugerem que abordagens terapêuticas baseadas em atenção plena, reeducação cognitiva e regulação emocional podem ajudar a aliviar os sintomas.

Reconhecer a complexidade da misofonia é um passo importante para oferecer apoio adequado e mais empatia a quem vive sob o constante ruído do incômodo.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.