Bactérias marinhas evoluem para decompor plástico em todos os oceanos

Enzima M5 revela micróbios capazes de transformar PET em alimento (Imagem: TrueCreatives/ Canva Pro)
Enzima M5 revela micróbios capazes de transformar PET em alimento (Imagem: TrueCreatives/ Canva Pro)

Bactérias marinhas desenvolveram enzimas capazes de decompor plástico PET, a mesma substância presente em garrafas e roupas sintéticas, transformando resíduos sintéticos em fonte de carbono. Um estudo da KAUST, publicado no The ISME Journal, mapeou a distribuição global desses micro-organismos e revelou padrões enzimáticos únicos, conhecidos como motivo M5.

O motivo M5 atua como uma impressão digital bioquímica, permitindo identificar enzimas PETase verdadeiramente funcionais. Essa descoberta mostra que os micróbios marinhos não apenas sobrevivem, mas prosperam em ambientes onde o plástico se tornou uma nova fonte de carbono.

Principais achados do estudo:

  • Presença global: versões funcionais da PETase com M5 foram detectadas em quase 80% das amostras oceânicas;
  • Profundidade extrema: bactérias adaptadas ao plástico vivem até 2 km abaixo da superfície, em áreas pobres em nutrientes;
  • Expressão genética ativa: genes de M5-PETase são vigorosamente ativados em regiões com alta poluição plástica;
  • Potencial industrial: enzimas marinhas podem inspirar soluções de reciclagem em circuito fechado.

Como as enzimas evoluíram para degradar plástico

Bactérias marinhas evoluem e degradam plástico em todos os oceanos (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Bactérias marinhas evoluem e degradam plástico em todos os oceanos (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

Durante décadas, o PET foi considerado praticamente indestrutível. A redescoberta da biodegradação começou em 2016, com a identificação de uma bactéria japonesa capaz de quebrar o plástico industrialmente. No entanto, até agora, permanecia uma dúvida: enzimas similares poderiam evoluir naturalmente nos oceanos?

A equipe da KAUST combinou modelagem estrutural baseada em inteligência artificial, triagem genética e experimentos laboratoriais para mapear a presença do motivo M5. Eles constataram que a estrutura dessa enzima permite que certas bactérias absorvam e utilizem o PET como fonte de energia, conferindo uma vantagem evolutiva em ambientes de baixo carbono.

Impacto ecológico e aplicações futuras

Do ponto de vista ambiental, a disseminação dessas enzimas indica uma resposta microbiana precoce ao lixo plástico global. No entanto, essa reação natural ainda é lenta diante da quantidade de resíduos que chegam aos oceanos.

Por outro lado, em aplicações práticas, a descoberta oferece oportunidades promissoras:

  • Reciclagem industrial: modelar enzimas oceânicas para degradar PET em estações de tratamento;
  • Tecnologia doméstica: potencial criação de enzimas para reciclagem eficiente de plásticos em casa;
  • Pesquisa de biotecnologia: M5 fornece um guia estrutural para otimização em condições reais.

Esses avanços mostram que, enquanto a humanidade busca soluções para o lixo plástico, a própria natureza já oferece aliados inesperados no abismo oceânico.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.