As trilhas dos aviões no céu podem estar acelerando o aquecimento global

Rastros de aviões no céu também ajudam a aquecer o planeta (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Rastros de aviões no céu também ajudam a aquecer o planeta (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

Quando observamos as linhas brancas deixadas por aviões cruzando o céu, raramente pensamos nelas como um problema ambiental. No entanto, pesquisas recentes mostram que essas trilhas (chamadas de contrails) podem contribuir de forma relevante para o aquecimento global, em alguns contextos com efeito climático comparável ao das emissões de dióxido de carbono (CO₂) da aviação.

Tradicionalmente, o debate climático sobre o transporte aéreo se concentrou no combustível fóssil. Contudo, um estudo publicado na revista Nature Communications amplia essa visão ao demonstrar que os impactos da aviação vão além dos gases de efeito estufa de longa duração. É importante entender alguns pontos-chave:

  • Contrails são formadas por cristais de gelo em altas altitudes;
  • Podem persistir por horas e se espalhar como nuvens finas;
  • Alteram o equilíbrio térmico da atmosfera;
  • Seu impacto depende de horário, altitude e condições atmosféricas.

Como os contrails interferem no balanço térmico do planeta?

As contrails surgem quando o vapor d’água liberado pelos motores encontra camadas frias e úmidas do ar. Em determinadas condições, essas trilhas se dissipam rapidamente. Em outras, transformam-se em nuvens artificiais semelhantes aos cirros, que cobrem grandes áreas do céu.

Contrails: as trilhas invisíveis da aviação no aquecimento global (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Contrails: as trilhas invisíveis da aviação no aquecimento global (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

Essas formações exercem dois efeitos opostos: refletem parte da luz solar, mas também retêm o calor irradiado pela superfície da Terra. O problema é que, especialmente à noite, o efeito de retenção predomina, funcionando como um isolante térmico atmosférico.

Medindo o custo climático além do CO₂

Para estimar esse impacto, os pesquisadores analisaram centenas de milhares de voos e cruzaram dados atmosféricos com modelos climáticos e econômicos. O objetivo foi calcular o custo social do aquecimento, um indicador que traduz danos futuros à saúde, à agricultura e à economia global.

Os resultados indicam que, no cenário mais provável, as contrails são responsáveis por cerca de 15% do impacto climático total da aviação. Embora durem poucas horas, sua intensidade e frequência tornam o efeito cumulativo relevante.

Nem todo voo aquece da mesma forma

Um ponto crucial do estudo é que nem todas as contrails aquecem o planeta. Apenas parte dos voos gera trilhas com efeito líquido de aquecimento. Isso abre espaço para soluções práticas, como ajustes sutis de rota ou altitude, capazes de reduzir o impacto climático sem grandes mudanças tecnológicas.

Ao incluir efeitos de curto prazo no debate climático, a pesquisa reforça que estratégias operacionais inteligentes podem ser aliadas no combate às mudanças climáticas. Enquanto combustíveis sustentáveis e novas tecnologias ainda avançam, decisões baseadas em ciência já podem fazer diferença no céu e no clima.

Leandro Sinis é biólogo, formado pela UFRJ, e atua como divulgador científico. Apaixonado por ciência e educação, busca tornar o conhecimento acessível de forma clara e responsável.