O sofrimento mental no trabalho deixou de ser um tema restrito aos consultórios e passou a ocupar um espaço central no debate sobre saúde pública. Segundo dados do INSS, os afastamentos por transtornos mentais cresceram 66% em apenas um ano, passando de 283 mil casos em 2023 para 471 mil em 2024.
O aumento expõe o impacto da pressão por produtividade, da insegurança no emprego e da falta de reconhecimento profissional.
As profissões mais afetadas
O levantamento identificou cinco categorias com maior número de afastamentos por motivos de saúde mental reconhecidos como doenças ocupacionais:
- Técnicos de enfermagem
- Vigilantes
- Motoristas de ônibus
- Gerentes de banco
- Escriturários de banco
Entre elas, os gerentes de banco ocupam o topo do ranking, com quase 38% dos afastamentos reconhecidos oficialmente como relacionados ao trabalho. O ambiente bancário, marcado por metas agressivas e alta competitividade, é apontado como um dos mais propensos ao esgotamento psicológico.
No caso dos motoristas de ônibus, embora muitos sejam afastados por problemas de saúde mental, a maioria desses casos não é reconhecida como relacionada ao trabalho. Em cada dez afastamentos, apenas dois têm esse vínculo confirmado. Isso mostra como ainda é difícil comprovar que o adoecimento mental foi causado pelas condições de trabalho, o que leva a uma grande subnotificação desses casos.
O peso das metas e da falta de reconhecimento

O cenário descrito pelos pesquisadores evidencia uma nova fase da saúde coletiva: uma “era epidemiológica do sofrimento psíquico laboral”. A rotina de longas jornadas, metas quase inalcançáveis e falta de valorização leva muitos profissionais à exaustão emocional, ansiedade e depressão.
O avanço da tecnologia também exerce um papel duplo: ao mesmo tempo que otimiza tarefas, aumenta o controle e a cobrança sobre o desempenho, gerando sensação de constante vigilância e insegurança. Essa combinação tem provocado uma escalada de síndromes de burnout, especialmente em profissões com alto contato humano e responsabilidade contínua.
A dificuldade de reconhecer o adoecimento mental como ocupacional
Apesar do crescimento expressivo nos casos, o reconhecimento do transtorno mental como doença ocupacional ainda é um desafio no Brasil. Muitos afastamentos são registrados sem vínculo direto com o trabalho, o que impede o acesso a benefícios específicos e a políticas de reabilitação adequadas.
A diferença entre categorias é marcante: enquanto quase 40% dos afastamentos de gerentes de banco são reconhecidos como ocupacionais, entre técnicos de enfermagem, o percentual cai para apenas 8%. Essa disparidade revela o quanto o estigma e a falta de diagnóstico adequado ainda invisibilizam o sofrimento mental de grande parte dos trabalhadores.
Caminhos para um ambiente mais saudável
Promover ambientes de trabalho mais humanos e sustentáveis é o principal desafio das empresas e instituições públicas. Entre as medidas recomendadas por especialistas estão:
- Reduzir metas abusivas e jornadas extensas;
- Criar políticas de apoio psicológico e prevenção;
- Valorizar o reconhecimento e a autonomia dos profissionais;
- Incentivar pausas e descanso adequado.
A saúde mental deixou de ser apenas um tema individual, tornou-se uma questão estrutural e urgente. Reconhecer o problema é o primeiro passo para transformar o ambiente de trabalho em um espaço de realização, e não de adoecimento.

