Durante décadas, a ciência acreditou que doenças mentais surgiam exclusivamente da combinação de múltiplos genes, associados a fatores ambientais. No entanto, uma nova descoberta científica rompe esse paradigma ao identificar, pela primeira vez, um gene capaz de causar transtornos mentais de forma direta. O achado representa um divisor de águas na compreensão da biologia da saúde mental e abre caminho para diagnósticos mais precoces e terapias de precisão.
A descoberta envolve o gene GRIN2A, associado à sinalização cerebral e ao funcionamento de circuitos neurais essenciais para o comportamento, a cognição e as emoções.
O que torna o gene GRIN2A diferente dos demais
O estudo intitulado “Null variants of GRIN2A confer high risk for early-onset schizophrenia and other mental disorders, enabling precision therapies”, publicado na revista científica Molecular Psychiatry, analisou dados genéticos de 121 indivíduos portadores de variantes raras do gene GRIN2A.
Os resultados demonstraram que determinadas alterações nesse gene estão diretamente ligadas ao desenvolvimento de esquizofrenia de início precoce, além de outros transtornos psiquiátricos. O mais surpreendente foi observar que, em vários casos, os sintomas surgiram ainda na infância ou adolescência, muito antes da idade habitual de manifestação dessas condições.
Além disso, parte dos indivíduos apresentou exclusivamente sintomas psiquiátricos, sem epilepsia ou deficiência intelectual, quadros geralmente associados ao GRIN2A.
Como o GRIN2A interfere na comunicação cerebral

O gene GRIN2A codifica uma subunidade do receptor NMDA, fundamental para a comunicação elétrica entre os neurônios. Esse receptor participa de processos como aprendizado, memória e regulação emocional.
As variantes identificadas no estudo reduzem a função do receptor NMDA, prejudicando a transmissão de sinais no cérebro. Como consequência, ocorre um desequilíbrio neural que pode favorecer o surgimento precoce de transtornos mentais graves.
Esse mecanismo ajuda a explicar por que algumas pessoas desenvolvem sintomas psiquiátricos isolados, enquanto outras apresentam quadros neurológicos mais amplos.
Um caminho promissor para terapias de precisão
Além de identificar a causa genética, o estudo trouxe indícios de uma abordagem terapêutica potencialmente eficaz. Em análises iniciais, a suplementação com L-serina, uma substância capaz de ativar o receptor NMDA, esteve associada à melhora de sintomas psiquiátricos em alguns pacientes.
Esse resultado reforça a possibilidade de tratamentos personalizados, ajustados ao perfil genético do indivíduo, algo ainda raro na psiquiatria moderna.
Impacto para o futuro da saúde mental
A identificação do GRIN2A como o primeiro gene comprovadamente causador de doença mental redefine conceitos fundamentais da psiquiatria e da genética. Além de permitir diagnósticos mais precoces, essa descoberta fortalece a busca por intervenções direcionadas, reduzindo tentativas terapêuticas generalizadas e aumentando a eficácia dos tratamentos.
À medida que a ciência avança, compreender a base genética dos transtornos mentais pode transformar radicalmente a forma como essas condições são prevenidas, diagnosticadas e tratadas.

