Besouro africano surpreende pesquisadores ao usar a Via Láctea como bússola natural

Inseto africano usa a Via Láctea como bússola em navegação precisa. (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Inseto africano usa a Via Láctea como bússola em navegação precisa. (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

A habilidade de se orientar é essencial para a sobrevivência de inúmeras espécies, mas alguns animais ultrapassam qualquer expectativa. Pesquisas recentes revelaram que um besouro africano rola-bosta não depende apenas do Sol ou da Lua para manter seu percurso: ele utiliza o brilho difuso da Via Láctea como referência celeste para escapar rapidamente da concorrência por alimento. Essa descoberta, publicada em Journal of Experimental Biology por equipes da Universidade de Wits e da Universidade de Lund, redefine o que se sabia sobre navegação animal.

Enquanto outras espécies se apoiam em marcos terrestres, esse inseto se orienta com base em uma estrutura galáctica inteira, mesmo caminhando de costas, com a cabeça voltada para o chão. Pontos essenciais sobre o comportamento do besouro:

  • A trajetória segue quase perfeitamente reta graças ao contraste luminoso da Via Láctea;
  • O inseto usa uma espécie de “dança de alinhamento” antes de partir;
  • A preferência luminosa segue uma hierarquia entre Lua, luz polarizada e galáxia;
  • Testes em planetários confirmaram que a orientação falha sem o brilho galáctico;
  • Em dias quentes, as bolas de esterco funcionam como refúgio térmico móvel.

Quando o céu vira mapa: a sofisticada leitura da luz

O besouro enxerga o céu de forma extremamente sensível. Embora não identifique constelações, ele percebe o gradiente claro-escuro da galáxia, usando essa diferença de luminosidade como uma bússola natural. Assim, ao moldar uma esfera de alimento, afasta-se rapidamente do monte para evitar disputas, guiado por uma referência cósmica que permanece estável no firmamento.

Besouro surpreende ao se orientar pelo brilho difuso da Via Láctea. (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Besouro surpreende ao se orientar pelo brilho difuso da Via Láctea. (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

Essa navegação foi confirmada em experimentos controlados, nos quais a Via Láctea simulada era essencial para manter a direção. Quando o brilho galáctico desaparecia, o inseto perdia completamente a precisão do trajeto.

A dança que desbloqueia a orientação estelar

Antes de rolar sua esfera, o besouro sobe sobre ela e gira o corpo em pequenos movimentos circulares. Essa “dança” funciona como uma varredura visual do céu, identificando a fonte luminosa mais útil naquele momento. Estudos mostram que essa etapa é indispensável: quando parte do campo de visão do inseto é bloqueada, sua capacidade de orientação se desfaz.

Esse comportamento integra um sistema hierárquico, no qual a Lua é preferida quando presente; caso contrário, o inseto passa a depender da galáxia.

Bolas de esterco como abrigo térmico 

Além do talento de navegação, os pesquisadores identificaram estratégias inesperadas. Em dias de calor extremo, o besouro não sobe na esfera para observar o céu, mas para reduzir o risco de superaquecimento. A bola funciona como uma plataforma isolante, protegendo o inseto do solo quente.

Quando os cientistas usaram pequenas “botinhas” de silicone para proteger as patas, esse comportamento praticamente desapareceu, evidência de que o objetivo era exclusivamente térmico.Esse é o primeiro caso documentado de um inseto utilizando um abrigo móvel contra o calor, reforçando a complexidade surpreendente de suas adaptações.

Leandro Sinis é biólogo, formado pela UFRJ, e atua como divulgador científico. Apaixonado por ciência e educação, busca tornar o conhecimento acessível de forma clara e responsável.