Método inovador transforma vírus em caçadores eficientes de bactérias resistentes

Fagos treinados mostram nova esperança contra infecções resistentes (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Fagos treinados mostram nova esperança contra infecções resistentes (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

A crise global da resistência aos antibióticos avança rapidamente, reduzindo as opções terapêuticas e ampliando o risco de infecções graves sem tratamento eficaz. Diante desse cenário alarmante, novas abordagens biotecnológicas têm ganhado destaque e uma delas se apoia em um aliado pouco convencional: os bacteriófagos, vírus capazes de atacar bactérias de forma altamente específica.

Um estudo publicado na Nature Communications, liderado por David T. Pride, da UC San Diego, demonstrou que esses vírus podem ser “treinados” para se tornarem ainda mais eficientes contra cepas resistentes, incluindo a temida Klebsiella pneumoniae, frequentemente associada a infecções hospitalares severas. Destaques do estudo:

  • Fagos foram submetidos a um processo de evolução em laboratório por 30 dias;
  • O objetivo foi aumentar a capacidade de atacar cepas altamente resistentes;
  • O método ampliou a capacidade dos vírus de eliminar diferentes variantes de K. pneumoniae;
  • Os fagos ajustados mantiveram o controle sobre o crescimento bacteriano por mais tempo;
  • Análises genéticas revelaram mutações que favoreceram o reconhecimento das bactérias.

Pesquisadores usam a evolução guiada para acelerar a adaptação dos vírus

Vírus aliados ajudam a derrotar bactérias imunes a antibióticos (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Vírus aliados ajudam a derrotar bactérias imunes a antibióticos (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

Para superar a limitação natural dos fagos, sua extrema especificidade, os cientistas utilizaram uma técnica chamada evolução experimental. Nesse processo, vírus e bactérias convivem em um ambiente controlado, desafiando-se continuamente. Assim, os fagos passam por ciclos de adaptação que os tornam mais aptos a reconhecer, infectar e destruir cepas resistentes.

Esse “treinamento” de 30 dias resultou em vírus capazes de enfrentar até mesmo variantes multirresistentes e extensivamente resistentes, um dos maiores obstáculos atuais da medicina moderna.

Potencial terapêutico e futuro da medicina antimicrobiana

As análises genômicas mostraram que os fagos evoluídos desenvolveram mutações em regiões essenciais para o início da infecção. Essas modificações aumentaram a habilidade de se ligar às bactérias, tornando o processo de destruição mais rápido e mais eficaz. Além disso, observou-se que o controle sobre o crescimento bacteriano se prolongou, reduzindo o risco de recidivas.

Os resultados reforçam a terapia com fagos como uma estratégia complementar aos antibióticos tradicionais, especialmente em infecções onde esses medicamentos já não funcionam. A abordagem é flexível, podendo ser direcionada para outros patógenos resistentes, ampliando o arsenal contra infecções potencialmente fatais.

Se confirmada em estudos clínicos, essa tecnologia poderá transformar a forma como tratamos doenças causadas por superbactérias, oferecendo alternativas mais seguras, precisas e adaptáveis às pressões evolutivas dos microrganismos.

Leandro Sinis é biólogo, formado pela UFRJ, e atua como divulgador científico. Apaixonado por ciência e educação, busca tornar o conhecimento acessível de forma clara e responsável.