Fósseis com 280 milhões de anos paralisam rodovia no Paraná e intrigam cientistas

Fósseis revelam vida aquática no Paraná há 280 milhões de anos. (Foto: GeoPotinga via Wikimedia Commons)
Fósseis revelam vida aquática no Paraná há 280 milhões de anos. (Foto: GeoPotinga via Wikimedia Commons)

Uma obra rodoviária no interior do Paraná precisou ser suspensa após uma descoberta que remonta a um tempo anterior aos dinossauros. Pesquisadores encontraram fósseis do Mesosaurus brasiliensis, um réptil aquático que viveu há cerca de 280 milhões de anos, durante o Período Permiano.

A revelação ocorreu nas escavações da rodovia PR-364, entre Irati e São Mateus do Sul, e trouxe à tona uma parte esquecida da história geológica do planeta, quando os continentes ainda formavam um único bloco, conhecido como Gondwana.

Uma viagem de 280 milhões de anos

Os fósseis pertencem a uma das espécies mais antigas conhecidas da América do Sul e ajudaram, no início do século XX, a comprovar que a América e a África já estiveram unidas. Essa evidência se tornou uma das bases para a teoria da deriva continental, proposta por Alfred Wegener, que mais tarde daria origem ao conceito de tectônica de placas.

O Mesosaurus brasiliensis era um réptil semiaquático, com cerca de 40 centímetros de comprimento, corpo alongado e patas adaptadas tanto para nadar quanto para se deslocar em terra. Ele viveu em ambientes costeiros e lagos rasos, alimentando-se de pequenos peixes e crustáceos.

Impacto nas obras e preservação científica

Mesosaurus é um réptil pré-histórico que antecedeu os dinossauros. (Foto: FunkMonk via Wikimedia Commons)
Mesosaurus é um réptil pré-histórico que antecedeu os dinossauros. (Foto: FunkMonk via Wikimedia Commons)

Com a descoberta, o Instituto Água e Terra (IAT) suspendeu a licença ambiental da obra, após recomendação do Ministério Público Federal, até que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) conclua uma avaliação técnica. A medida busca garantir que o sítio paleontológico seja devidamente preservado e estudado antes da retomada da pavimentação.

A rodovia, que já estava 52% concluída, teve 1,6 km de trecho interrompido. O plano original incluía um viaduto e uma ponte sobre o Rio Turvo, além de uma ciclofaixa em São Mateus do Sul. Agora, o projeto passará por revisão até que as análises paleontológicas terminem.

O elo entre dois continentes

Pesquisadores da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro) analisam mais de 30 fragmentos fossilizados encontrados no local. As rochas que abrigaram os fósseis são do tipo folhelho betuminoso, conhecidas por preservar matéria orgânica e formar registros detalhados de ambientes aquáticos antigos.

Esses fósseis reforçam o vínculo entre Brasil e África, já que exemplares idênticos de Mesosaurus foram encontrados em ambos os continentes. Essa coincidência geológica é uma das provas mais sólidas de que as massas de terra hoje separadas já estiveram unidas há milhões de anos.

Paraná pré-histórico

Mais do que um contratempo em uma obra pública, a descoberta é um marco científico e histórico. Cada fragmento encontrado ajuda a compreender como era o planeta muito antes dos dinossauros, quando o Paraná abrigava lagos e mares interiores.

O caso também reacende o debate sobre a importância de conciliar desenvolvimento e preservação ambiental, garantindo que o avanço da infraestrutura caminhe lado a lado com o respeito ao patrimônio natural e histórico.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.