Leopardos encontrados em caverna saudita revelam genética perdida

Múmia preservada no local original dentro da caverna. (Foto: Ahmed Boug et.al)
Múmia preservada no local original dentro da caverna. (Foto: Ahmed Boug et.al)

O achado recente de leopardos mumificados em uma caverna no norte da Arábia Saudita trouxe à luz informações únicas sobre a história genética e comportamental desses grandes felinos. Essa descoberta não apenas mostra como condições naturais podem preservar animais por milênios, mas também lança novas perspectivas sobre a conservação de espécies na região.

Leopardos preservados naturalmente

Os restos mortais de sete leopardos foram encontrados em um conjunto de cavernas exploradas entre 2022 e 2023. A análise aponta que eles datam de períodos entre 4.000 e 100 anos atrás, configurando os primeiros registros conhecidos de grandes felinos mumificados de forma natural. Além destas, ossadas de pelo menos outros 54 indivíduos sugerem que as cavernas foram visitadas por leopardos ao longo de diferentes épocas.

A mumificação ocorreu devido à baixa umidade e temperatura estável das cavernas, condições que interrompem o processo de decomposição e preservam os tecidos moles. Isso permitiu que pesquisadores estudassem detalhes anatômicos e morfológicos raramente disponíveis em espécies selvagens.

Mistérios do comportamento

Reconstruções 3D mostram crânio, tecidos e tórax da múmia. (Foto: Ahmed Boug et.al)
Reconstruções 3D mostram crânio, tecidos e tórax da múmia. (Foto: Ahmed Boug et.al)

A presença dos animais em cavernas sem fontes de água gera questionamentos sobre o comportamento desses felinos. Uma hipótese é que alguns indivíduos tenham caído acidentalmente em áreas de difícil saída. 

Surpreendentemente, a maioria das ossadas corresponde a filhotes e jovens, o que sugere que as fêmeas podem ter utilizado as cavernas como refúgio temporário para criar os filhotes, indicando um comportamento de cuidado ainda não documentado.

Entre os 20 crânios analisados, seis pertenciam a adultos, enquanto os demais tinham idades entre seis e 24 meses, incluindo restos de nove filhotes. Esses dados oferecem pistas sobre a dinâmica populacional e estratégias de sobrevivência desses predadores em ambientes áridos.

Revelações genéticas

O aspecto mais fascinante da descoberta está no DNA extraído dos restos mortais. O indivíduo mais recente demonstrou afinidade com o leopardo asiático (Acinonyx jubatus venaticus), atualmente restrito a pequenas populações no Irã. Já amostras com 3.000 e 4.000 anos de idade mostraram semelhanças com o leopardo do noroeste africano (A. j. hecki), hoje restrito a regiões fragmentadas do Sahel.

Essas análises revelam que, no passado, a Península Arábica abrigava uma diversidade genética maior, funcionando como uma ponte ecológica entre África e Ásia. A descoberta reforça a plasticidade ecológica das subespécies e sugere que reintroduções futuras na região poderiam aproveitar populações africanas geneticamente compatíveis.

Implicações para conservação

Com os leopardos classificados como vulneráveis pela União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN), esses achados oferecem informações essenciais para estratégias de proteção de espécies e recuperação de habitats

Além disso, o estudo destaca como registros históricos e genéticos podem complementar o conhecimento sobre biodiversidade e orientar políticas ambientais no Oriente Médio.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.