Descoberta científica revela o que causa alucinações auditivas na esquizofrenia

Cérebro “quebrado” gera vozes em pacientes. (Foto: Yuri Arcurs via Canva)
Cérebro “quebrado” gera vozes em pacientes. (Foto: Yuri Arcurs via Canva)

As alucinações auditivas são um dos sintomas mais intrigantes da esquizofrenia, afetando cerca de 40% dos pacientes. Por décadas, a ciência buscou entender como o cérebro cria essas experiências que soam como vozes externas, mas que na realidade se originam internamente. 

Um estudo recente, conduzido por pesquisadores na China e nos Estados Unidos e publicado na revista PLOS Biology, trouxe um novo entendimento sobre esse fenômeno.

Como o cérebro processa o som e a fala

No estudo, os cientistas focaram em dois conceitos essenciais da neurociência:

  • Descarga corolária (CD): mecanismo que reduz respostas sensoriais a ações próprias, permitindo distinguir eventos internos e externos.
  • Cópia de eferência (EC): aprimora respostas sensoriais específicas ligadas a movimentos planejados, como falar.

Em cérebros saudáveis, esses sistemas funcionam em harmonia, garantindo que o indivíduo perceba suas próprias ações de forma clara e que os sons internos não sejam confundidos com externos.

Diferenças observadas em pacientes com esquizofrenia

CD e EC alterados geram vozes em esquizofrenia. (Foto: Pressmaster via Canva)
CD e EC alterados geram vozes em esquizofrenia. (Foto: Pressmaster via Canva)

O estudo analisou três grupos: pacientes com esquizofrenia que apresentam alucinações auditivas, pacientes com esquizofrenia sem alucinações e indivíduos saudáveis. Durante experimentos que simulavam preparação e execução da fala, os pesquisadores usaram eletroencefalografia (EEG) para medir as respostas cerebrais.

  • Pacientes com alucinações auditivas mostraram falhas no sistema de CD, não conseguindo suprimir respostas auditivas gerais.
  • O sistema de EC desses pacientes apresentava respostas aumentadas para sons diferentes do que estavam prestes a pronunciar, criando uma percepção distorcida de vozes externas.

Essa combinação resulta em um “CD quebrado” e “EC barulhento”, explicando tanto a dificuldade em distinguir pensamentos internos de sons externos quanto o conteúdo muitas vezes sem sentido das alucinações.

Implicações para tratamento e pesquisa

A descoberta oferece uma compreensão mais precisa de como as alucinações auditivas surgem, abrindo caminho para:

  • Desenvolvimento de terapias focadas na modulação da atividade sensório-motora do cérebro.
  • Estratégias de intervenção que visem reduzir a confusão entre sons internos e externos.
  • Maior personalização do tratamento para pacientes com esquizofrenia, considerando diferenças individuais na função cerebral.

Este estudo revela que as vozes na esquizofrenia não são simplesmente fruto de imaginação ou processamento sensorial errado, mas sim o resultado de um complexo desequilíbrio nos sistemas cerebrais de processamento e previsão. Compreender esses mecanismos é fundamental para avançar no tratamento e na qualidade de vida de quem enfrenta essa condição.

Rafaela Lucena é farmacêutica, formada pela UNIG, e divulgadora científica. Com foco em saúde e bem-estar, trabalha para levar informação confiável e acessível ao público de forma clara e responsável.