Chuvas e tempestades no Brasil em 2025 podem não estar ligadas a La Niña

La Niña 2025 ainda não está confirmada e gera dúvidas no clima (Imagem: Gerada por IA/ Gemini)
La Niña 2025 ainda não está confirmada e gera dúvidas no clima (Imagem: Gerada por IA/ Gemini)

Nos últimos meses, previsões meteorológicas têm sugerido a possibilidade de La Niña em 2025, gerando especulações sobre os impactos climáticos no Brasil. No entanto, é fundamental compreender que a existência e os efeitos do fenômeno ainda não estão confirmados. Muitas análises recentes desconsideram critérios técnicos e a complexidade do clima, levando a interpretações equivocadas e conclusões precipitadas.

La Niña é a fase fria do ciclo El Niño–Oscilação Sul (ENOS) e depende de resfriamento persistente das águas do Pacífico Equatorial, principalmente nas regiões Niño 3.4 e Niño 1+2. Para ser classificado oficialmente, o fenômeno exige que anomalias de temperatura da superfície do mar sejam -0,5°C ou mais frias que a média por vários meses consecutivos.

Entre os principais pontos que diferenciam uma previsão de La Niña de um fenômeno estabelecido, destacam-se:

  • Persistência prolongada: o resfriamento deve ocorrer por pelo menos cinco trimestres consecutivos;
  • Intensificação dos ventos alísios: ventos de leste mais fortes são essenciais para a consolidação do fenômeno;
  • Impactos climáticos consistentes: mudanças de temperatura e padrões de chuva devem ser detectáveis globalmente;
  • Resfriamento significativo do Pacífico Equatorial: anomalias menores não provocam alterações relevantes na atmosfera;
  • Interação com correntes oceânicas e outros fatores climáticos: a formação de La Niña depende de múltiplas condições simultâneas, não apenas da temperatura da superfície do mar.

Por que o clima brasileiro está diferente?

Previsões de La Niña podem não refletir o impacto real no Brasil (Imagem: Gerada por IA/ Gemini)
Previsões de La Niña podem não refletir o impacto real no Brasil (Imagem: Gerada por IA/ Gemini)

Outro fator crítico que dificulta a formação de La Niña são as correntes oceânicas, influenciadas por ventos, salinidade, temperatura e rotação da Terra. A Corrente de Humboldt (Pacífico Sul) e a Corrente da Califórnia (Pacífico Norte) transportam águas mais quentes para as regiões Niño 1+2 e Niño 3.4, diminuindo o resfriamento necessário.

Mesmo que haja pequenas quedas de temperatura, elas não persistem tempo suficiente para alterar o clima brasileiro de maneira significativa. Apesar da especulação sobre La Niña, eventos de chuva intensa e tempo severo no Centro-Sul e Região Sul do Brasil estão relacionados a outros padrões climáticos.

Entre os mais importantes estão o Vórtice Polar enfraquecido sobre a Antártica, a Oscilação Antártica (AAO) negativa, que intensifica frentes frias e ciclones extratropicais, e o Dipolo do Índico (IOD) negativo, que aumenta as chuvas no Sudeste, Centro-Oeste e Sul do país. Esses fatores explicam os eventos climáticos atuais sem relação direta com o resfriamento do Pacífico Equatorial, mostrando que a associação com La Niña é precipitada.

Cuidado com previsões equivocadas

Clima brasileiro em 2025 mostra eventos intensos sem relação com La Niña (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Clima brasileiro em 2025 mostra eventos intensos sem relação com La Niña (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

Classificar antecipadamente um La Niña em 2025 é cientificamente incorreto. Ignorar os critérios formais do ENOS, o comportamento das correntes oceânicas e os demais fatores climáticos locais gera desinformação e previsões enganosas.

Uma análise confiável deve considerar persistência e intensidade das anomalias do Pacífico Equatorial, efeitos regionais sobre o Brasil e a interação com padrões como AAO e IOD. Estudos publicados na Journal of Climate e no Bulletin of the American Meteorological Society recomendam monitoramento atento, mas não se basear em previsões simplificadas de La Niña.

Leandro Sinis é biólogo, formado pela UFRJ, e atua como divulgador científico. Apaixonado por ciência e educação, busca tornar o conhecimento acessível de forma clara e responsável.