Acidez oceânica é monitorada de forma inédita por sinais acústicos

Ruído do oceano permite medir acidificação em grandes profundidades (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Ruído do oceano permite medir acidificação em grandes profundidades (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

A acidificação dos oceanos é um efeito direto do aumento do dióxido de carbono desde a Revolução Industrial, tornando as águas marinhas cerca de 30% mais ácidas. Esse fenômeno ameaça recifes de corais, moluscos e outros organismos marinhos, impactando ecossistemas inteiros. Tradicionalmente, medir a acidez oceânica é um processo pontual, trabalhoso e limitado em escala, dificultando o monitoramento contínuo e global.

Recentemente, oceanógrafos acústicos desenvolveram uma abordagem inovadora usando ruído de vento ambiente e instrumentos como o Deep Sound, capaz de estimar o pH a profundidades de até 10 km.

Como o método funciona?

Nova técnica acústica monitora o pH dos oceanos globalmente (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Nova técnica acústica monitora o pH dos oceanos globalmente (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

O estudo, publicado no Journal of Geophysical Research: Oceans, combina perfiladores acústicos autônomos de queda livre com dados passivos do ruído oceânico, coletados ao longo de mais de uma década em regiões como o Mar das Filipinas, Fossa das Marianas e Fossa de Tonga. A técnica se baseia em princípios físicos e químicos:

  • À medida que o som se propaga, parte da energia é absorvida pelos constituintes químicos da água;
  • Esse processo, chamado relaxamento químico, envolve a modulação de equilíbrios de reações iônicas, dependentes da pressão e da composição química da água;
  • Substâncias como ácido bórico, carbonato de magnésio e sulfato de magnésio desempenham papel central na absorção acústica.

Essa absorção varia com frequência e temperatura, e se torna particularmente sensível ao pH abaixo de 3 kHz, devido à relação direta entre o ácido bórico e os íons de hidrogênio.

Vantagens e aplicações

O método permite estimativas de pH variando entre 7,74 e 8,18, possibilitando:

  • Monitoramento passivo de longo prazo da acidificação oceânica;
  • Redução da necessidade de transmissões ativas, que demandam maior energia e apresentam menor precisão;
  • Criação de séries temporais em grandes áreas, oferecendo visão mais abrangente do fenômeno.

Limitações e perspectivas

Cientistas usam som do mar para estudar mudanças químicas na água (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)
Cientistas usam som do mar para estudar mudanças químicas na água (Imagem: Getty Images/ Canva Pro)

Apesar dos avanços, alguns desafios persistem:

  • Diferentes modelos de absorção podem gerar estimativas de pH divergentes, introduzindo incertezas;
  • Variabilidade do vento e outras fontes de ruído podem comprometer a qualidade dos dados;
  • Os perfis de pH ainda não alcançam alta resolução espacial.

No entanto, ajustes como veículos de coleta mais lentos e técnicas de processamento coerente prometem reduzir erros e melhorar a precisão das medições.

Um passo à frente no estudo dos oceanos

Esta abordagem representa uma revolução no monitoramento da acidificação, oferecendo uma alternativa prática e escalável aos métodos tradicionais. Com dados validados, cientistas poderão gerar séries históricas e contínuas de pH oceânico, fundamentais para entender os impactos das mudanças climáticas nos ecossistemas marinhos e orientar políticas ambientais globais.

Leandro Sinis é biólogo, formado pela UFRJ, e atua como divulgador científico. Apaixonado por ciência e educação, busca tornar o conhecimento acessível de forma clara e responsável.